Guedes quer ajuda da ala política para ajustar Orçamento e avalia vetos

O texto foi aprovado pelo Congresso na última semana com menos recursos que o necessário para despesas obrigatórias
créditos: Folhapress

 

O governo discute como vai resolver o impasse no Orçamento de 2021 enquanto o TCU (Tribunal de Contas da União) se prepara para elevar o tom e cobrar da Casa Civil ou do Ministério da Economia explicações sobre os procedimentos que levaram aos problemas nos números.

O texto foi aprovado pelo Congresso na última semana com menos recursos que o necessário para despesas obrigatórias, como aposentadorias. Isso ocorreu após o Ministério da Economia deixar de considerar a inflação atualizada nas contas e após parlamentares cortarem gastos para dar espaço a emendas.

O desenho final deixou o Orçamento sem recursos suficientes para despesas obrigatórias, que são demandadas por leis ou pela Constituição. Por isso, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ficou diante de um impasse jurídico para a sanção -que, no limite, pode gerar uma acusação de crime de responsabilidade.

O Ministério da Economia quer ajuda da ala política do governo para analisar alterações. A estratégia deve envolver inclusive o presidente Bolsonaro e os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Isso porque as alterações deverão passar pelo crivo do Congresso, que quis aprovar um Orçamento priorizando emendas parlamentares, especialmente para obras e projetos em suas bases eleitorais.

Membros da equipe econômica disseram à reportagem que o caminho mais adequado é Bolsonaro vetar aumentos em despesas incluídos pelos parlamentares. Posteriormente, o presidente enviaria um ou mais projetos de lei para repor a previsão de despesas obrigatórias.

Apesar de a saída ainda estar em discussão no governo, integrantes dizem que a solução é a que mais faz sentido diante da situação.

Técnicos farão uma varredura no projeto aprovado para saber exatamente o que pode ser vetado. Em alguns casos, o Congresso apenas ampliou recursos para obras e emendas.

Portanto, um veto pode inviabilizar um programa inteiro. Por exemplo, uma iniciativa de desenvolvimento urbano voltado à adequação viária, em vez de um projeto específico que foi turbinado pelos parlamentares.

Caso opte por vetos nas emendas, o governo deve enfrentar resistência no Congresso. Essa verba recebe a "digital" dos parlamentares e foi negociada inclusive por interlocutores de Bolsonaro para destravar a aprovação do Orçamento de 2021, que ocorreu com quase três meses de atraso.

Essas emendas dão ganhos políticos para deputados e senadores, de olho nas eleições de 2022. Esse capital eleitoral também atrai o governo, pois, com o desenrolar das obras, a avaliação de Bolsonaro tende a ser mais positiva.

O time de Guedes deseja uma solução rápida após o Orçamento de 2021 se arrastar por quase sete meses no Congresso antes da aprovação, gerando idas e vindas no debate sobre teto de gastos e provocando oscilações no humor de investidores.

Outra saída ventilada nos últimos dias, a reformulação de um Orçamento desde o começo, do zero, foi descartada pelo líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), em entrevista à Folha.

Entre os integrantes da equipe, a situação do Orçamento é vista com ineditismo. Isso porque eventuais confusões na formulação das propostas no passado eram ajustáveis devido à folga para o cumprimento das regras fiscais.

Agora, não há como acomodar os números sobretudo devido à regra do teto de gastos (que impede o crescimento real das despesas).

A saída pelos vetos ganha força também porque o TCU está acompanhando o assunto de perto. O tribunal entrou no assunto após uma representação sobre o Orçamento feita por deputados nesta segunda.

De acordo com relatos de integrantes do TCU feitos à reportagem, o tribunal deve fazer um levantamento dos problemas que levaram ao imbróglio. Mesmo que não haja uma posição conclusiva, o tribunal deve emitir um posicionamento "suficientemente duro" sobre o tema.

O documento está vinculado a um processo de relatoria do ministro Bruno Dantas que acompanha os efeitos da pandemia no Orçamento da União.

Antes disso, o caso será objeto de análise preliminar da unidade técnica do tribunal. Conforme integrantes do TCU, a área pode avaliar que seria um crime de responsabilidade Bolsonaro sancionar o Orçamento conforme o texto saiu do Congresso.

O Ministério da Economia deixou de considerar os números corretos da inflação no Orçamento de 2021. A proposta enviada ao Congresso em setembro considerava 2,09% para o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), que baseia o reajuste de despesas como aposentadorias e pensões.

O INPC fechou 2020 em 4,52%, conforme divulgação do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 12 de janeiro de 2021, o que elevou o volume de recursos demandados. Só nos benefícios previdenciários, por exemplo, a diferença elevou as despesas em R$ 8,5 bilhões.

O governo poderia enviar uma mensagem modificativa ao Congresso para "corrigir" o percentual antes da votação do Orçamento, como já foi feito em anos anteriores, mas não o fez. Com isso, o Orçamento já nascia com uma necessidade total de R$ 17,5 bilhões em cortes de despesas para haver cumprimento do teto de gastos.

Além disso, Congresso aprovou o Orçamento após um corte de R$ 26,5 bilhões na verba para a área social (abono salarial e seguro-desemprego), para Previdência Social (que paga aposentadoria, pensões e benefícios como auxílio doença) e subsídios para agricultura familiar. O projeto seguiu para sanção presidencial.

A tesourada permitiu que o volume de emendas parlamentares subisse de cerca de R$ 22 bilhões para R$ 48,8 bilhões.

O Orçamento foi aprovado na última quinta-feira (25) com o atraso de quase três meses. A demora obrigou o governo ficar numa espécie de piloto automático desde o começo do ano, executando recursos de forma restrita até o aval dos parlamentares.

A sanção do Orçamento vai permitir, por exemplo, que o governo antecipe para abril o início do pagamento da primeira parcela do 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Essa é uma das medidas que o governo planeja para combater os efeitos econômicos da Covid-19.

 


 


COLUNISTA
Eudes Martins
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